Postado em: 1 de junho, 2018.
Empreender uma jornada por rotas marítimas perigosas requer mais que um grupo de marujos experientes. O capitão precisa saber, também, qual o verdadeiro perigo e como enfrenta-lo.
No mar, nada está sob controle
Um novo capitão foi contratado para aquela embarcação de porte médio, com tripulação de 11 marujos, cuja missão era recolher uma carga preciosa de uma ilha povoada, na parte inóspita do Oceano Pacífico. O capitão anterior não conseguira realizar a tarefa e alguns homens morreram na jornada. Havia rumores de que aquela tripulação era incompetente, porque foram incapazes de manter a embarcação a salvo das adversidades.
A primeira coisa que o capitão fez foi reunir o grupo e procurar saber deles o que acontecerá para a missão ter dado errado. Ouviu relatos do mar revolto, das rochas escondidas na água, das tempestades inesperadas e o fato da embarcação não ser de grande porte. Disseram que ficaram malvistos por aquele fracasso, embora trabalhassem naquela atividade há muitos anos.
Squall tratou de fazer uma inspeção rigorosa no navio, para ter certeza das suas condições de suportar tempestades. Estudou com afinco as rotas, conferindo o tempo e as condições marinhas para aquela época; decorou cada detalhe das indicações das pedras e rochedos do trajeto a ser escolhido.
Seguro o suficiente de todos os detalhes a bordo e tendo o navio devidamente abastecido de mantimentos, zarpou com sua tripulação rumo ao destino planejado. O trajeto de ida não parecia oferecer nenhuma dificuldade à experiência daqueles homens, exceto por um incidente no terceiro dia de viagem: dois marujos brigaram entre si e um deles ficou ferido, necessitando de atendimento médico. A partir desse dia, era possível ao capitão perceber um clima de mal-estar entre a tripulação. Pequenos insultos e desentendimentos que perturbavam uma certa ordem na embarcação.
Após um pressentimento, Capitão Squall tratou de ter conversas pessoais, sempre que podia, com cada um dos marujos e percebeu que eram questões mais antigas, provenientes da fracassada missão anterior. Ouviu muitos relatos sórdidos e reclamações. Uns disseram que o grupo não se ajudou o suficiente, cada um trabalhava por si; outros não se gostavam por serem de nacionalidades diferentes; e ainda havia as reclamações de que alguns eram mais privilegiados do que os demais.
O capitão procurou impor sua autoridade até a chegada ao porto onde deveriam recolher a carga, mantendo a ordem às custas de uma constante vigilância e designação de tarefas sob controle. Mas, ele sabia que isso não era suficiente para evitar que algo pior pudesse acontecer durante o retorno.
As ameaças do mar de dentro
Levou alguns dias para tratar da burocracia e do carregamento do navio por completo, por isso Squall utilizou esse tempo para levantar novamente as condições de tempo na rota de volta. Havia possibilidade de fortes tempestades no trajeto principal, exigindo que tivessem de escolher um caminho mais longo e um pouco perigoso, em que, pelo menos, as tempestades seriam menos danosas.
Mediante toda a sua experiência, o capitão percebeu que aquelas condições não eram suficientes para interromper uma travessia, pois o navio estava bem preparado, a tripulação era experiente e poderiam superar os obstáculos de águas turbulentas. Havia algo mais grave que estava prestes a colocar tudo a perder…
Poucas horas antes de zarparem de volta, Squall reuniu novamente a tripulação, como fez antes da primeira jornada. Procurou encarar cada um com atenção e firmeza, dizendo-lhes:
— A missão anterior fracassou porque dentro dessa embarcação foi aberta a Caixa de Pandora e todos nós, humanos, somos vítimas dela!
Os marujos entreolharam-se, um pouco atordoados. Quem, diabos, era Pandora? O capitão demorou a reiniciar de propósito, mas logo explicou:
— Os antigos gregos falavam de uma caixa sob a guarda de uma mulher, chamada Pandora, na qual estavam trancafiadas as piores desgraças humanas: a intolerância, a discórdia, a guerra, o rancor e outros males. O recipiente foi dado por Zeus, que queria punir os homens e sabia que a curiosidade de Pandora a faria abrir a caixa. Uma vez aberta, esses males se instalaram na natureza humana e envenenam até hoje a convivência das pessoas. E isso está acontecendo entre vocês, de modo que, apesar de serem tão experientes, alimentam as intrigas a ponto de se deixarem fracassar em suas missões. Mas, Pandora conseguiu fechar a caixa, antes que saísse a esperança…
Um véu foi como que retirado das cabeças daqueles marujos e eles, pegos de supetão, expressavam um misto de espanto e vergonha. Depois de um silêncio que pareceu não ter fim, o capitão retomou sua fala:
— A missão anterior deu errado, não por causa dos problemas de fora. Não haveria nenhuma dificuldade com o mar revolto, com as tempestades, as rochas no caminho, as condições da embarcação, que pudessem fazer fracassar uma tripulação calejada de tantas viagens marítimas… Foram os perigos do mar de dentro. As mazelas impregnadas no coração de cada um fizeram aquele navio naufragar. Vocês se comportaram como um bando de marujos desordenados e não como uma equipe que tem uma missão a cumprir, acima de qualquer rixa pessoal. Portanto, querem sua reputação de volta ou vão fracassar pela segunda vez? Me deem a oportunidade de provar que vocês são excelentes marujos, cumprindo a jornada. Caso contrário, também não quero voltar àquele porto como fracassado e todos morreremos juntos.
Pela primeira vez em muitas jornadas, os marinheiros se sentiram como parte integrante de uma embarcação. Houve menos desavenças e mais ação. Chegaram ao porto com a sensação de que o navio estivera mais leve, mais ágil, mais forte para enfrentar o mar revolto porque, como dissera o capitão, o mar de dentro havia se acalmado
O capitão mostrara a eles, que grupos costumam fracassar, mas equipes sempre superam os obstáculos pela força de um elo muito resistente: a comunhão de interesses e propósitos. Um empreendimento não se realiza sozinho nem de forma dispersa. Necessita do envolvimento e da participação de cada colaborador para dar certo. E no final de cada missão, do sucesso de todos vem a reputação de cada um.