Postado em: 7 de setembro, 2018.
O Mercado é um ambiente complexo e de muita competitividade. Saber quando e como lidar com ações maliciosas são habilidades que se conquistam no embate constante das negociações. E, muitas vezes, a oportunidade de conseguir avançar subornando outros envolvidos é uma tentação. É diante desses dilemas e conflitos de negociação que o jogo Sheriff of Nottingham surge com importantes lições sobre condutas de mercado.
Diante de um clima de blefes, contrabandos e subornos
Nesse jogo de tabuleiro de até 5 participantes, cada jogador incorpora o papel de um mercador na cidade medieval de Nottingham, que está prestes a receber uma visita do Rei. É grande a oportunidade de fazer negócios com a realeza, vendendo produtos diversos como pães, maçãs, queijos e aves. Para aproveitar essa oportunidade, os mercadores devem levar produtos para dentro da cidade. Porém, todas as carroças são constantemente vigiadas pelo xerife, que tem ordem para inspecionar os produtos que entram naquele lugar, com intuito de apreender as mercadorias clandestinas que podem estar sendo contrabandeados.
Conforme a narrativa do próprio jogo, o xerife é um homem corrupto e ganancioso, diante de comerciantes desejosos de vender seus produtos, criando um clima de blefes, contrabandos e subornos. Isso ocorre em um contexto provocativo no qual o príncipe aumentou os impostos dos produtos e tornou ilegais as mercadorias de qualidade, com o propósito de confisca-las para sua corte.
O jogo acontece em 3 turnos e cada um destes se completa depois que cada jogador tiver cumprido, na sua vez, o papel de xerife. Desse modo, todos os jogadores experimentam a tentação de subornarem e serem subornados, ao mesmo tempo em que tentam convencer o xerife de que são honestos.
Os jogadores recebem 6 cartas aleatórias da pilha com as mercadorias; essas cartas devem ser reabastecidas a cada turno, de maneira que os mercadores sempre tenham 6 cartas na mão. Em seguida eles devem selecionar até 5 cartas para serem colocadas na bolsa de mercadorias, que funciona como a carroça, e que será avaliada pelo xerife do turno. O xerife, porém, pode escolher que bolsas pretende inspecionar e que bolsas vai deixar passar sem inspeção. No momento em que tem sua bolsa apreendida, o jogador pode oferecer suborno ao xerife. Este aceita ou não a oferta de agrados, sabendo que, se o mercador estiver com as mercadorias que declarou, é ele, o xerife, quem paga o valor em moedas pela sua desconfiança. Caso contrário, as mercadorias clandestinas são confiscadas e o mercador paga multa por elas.
As lições de ser honesto ou não nas negociações
Um dos maiores dilemas para quem é o xerife da vez é o fato de que, mesmo ganhando mais dinheiro ou agrados, com a aceitação do suborno, isso pode significar a perda do jogo. Afinal o mercador que conseguiu passar com seu contrabando estará acumulando uma pontuação extra muito boa para ser o vencedor ao final. Isso faz com que o xerife sempre pese as vantagens e desvantagens de suas averiguações: em determinado momento, aceitar o suborno pode ajuda-lo a não se descapitalizar a ponto de ficar sem dinheiro, mas também pode contribuir para que os outros vençam o jogo por terem mais pontos.
A busca por um equilíbrio de posturas ganha força no decorrer das negociações. Não dá para o xerife inspecionar todas as bolsas de mercadorias, porque se todos estiverem sendo honesto na rodada, ele vai ter que desembolsar toda sua grana e ficar descapitalizado; também não é legal deixar passar todas as bolsas, porque assim os contrabandistas vão acumular cada vez mais pontos. A alternativa é escolher algumas bolsas a serem inspecionadas e deixar passar outras, usando a percepção pessoal e a intuição para tentar captar suspeitas que podem ser confirmadas. Um sorriso maroto, mudanças no tom de voz, gestos sutis de nervosismo entre outros elementos humanos, podem servir de dicas para as decisões sobre quem será inspecionado ou não.
A aceitação de suborno pode fazer parte de uma estratégia maior para se conseguir equilibrar o jogo na contagem de pontos final. Entretanto, são ações que revelam como cada um se comporta quando está sendo honesto e quando está tentando conseguir vantagem indevida. Trata-se de um jogo sutil de percepções sobre o comportamento humano que mexe com a consciência, mesmo sendo uma simulação divertida no âmbito do entretenimento.
Alguns jogadores podem se vangloriar de ter ganho a partida sem ter sido desonesto nenhuma vez. Mas, geralmente a diferença de pontuação final está no equilíbrio de quando foi preciso, como xerife, aceitar pequenas ofertas, para evitar que grandes contrabandos conseguissem passar. Assim como, ser desonesto sempre, denuncia um vício de comportamento facilmente detectável.
Portanto, em Sheriff of Nottingham, a percepção de cada um sobre negociação é posta à prova; a capacidade de perceber nuances e sentimentos de honestidade e desonestidade é vivenciada; as estratégias de quando ser fiscalizador demais e quando afrouxar para ter um controle maior do mercado são experimentadas a cada rodada, com seus eventuais dissabores.
Na vida real as transações comerciais são bem mais complexos do que essa simples relação de troca, inspeção, controle, mas o jogo dá uma boa ideia de uma matriz mercadológica que, pelo prazer da diversão ensina e forja posturas e atitudes para quem busca experiência empreendedora na gestão de negócios.
Galápagos. Criação de Sérgio Halaban e André Zatz; Arte de Lorraine Schleter e David Sladek.